quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

A derrota de Bolsonaro não seria necessariamente uma vitória


“Onde os fracos não têm vez” é o título do artigo de Eduardo Matos de Alencar, publicado no início do ano. Admirador de Olavo de Carvalho, o autor é insuspeito ao avaliar que “Bolsonaro tem mais chances de perder estofo quando as peças e engrenagens do sistema político começarem a operar de maneira efetiva”.

São exatamente essas peças e engrenagens o tema principal do texto de Alencar, que trabalhou para várias prefeituras do Nordeste e foi gestor da implantação da “UPP Social” na Rocinha, em 2012.

É dessa experiência que ele retira evidências sobre o funcionamento do varejo da disputa de votos que forma o atacadão conservador da política institucional em um país extremamente desigual. 

Sobre os eleitores mais pobres, por exemplo, ele afirma:

Inúmeras dessas pessoas podem até declarar, num primeiro momento, a preferência por A ou B, mas a verdade é que quando a liderança comunitária, o vereador, o prefeito da cidade ou o deputado da região acionarem os mecanismos para “pedir” votos pelos seus aliados, acho bem difícil acreditar que as pessoas responderão diferentemente do esperado

É esta “capilaridade” que precisa ser dominada pelos que querem ter alguma chance no pesado jogo eleitoral nacional. Um fator tanto mais importante quanto maior a desigualdade, a pobreza, a ausência de serviços públicos. Elementos que jamais faltaram ao País e alimentam o pragmatismo do “rouba, mas faz” há muitas décadas.

O texto também descreve como o PT capitulou a essa lógica suja. E o pior é que não há como discordar. Mas acima de tudo, indica que uma derrota de Bolsonaro não merece necessariamente grandes comemorações.

O novo individualismo já tem alguns séculos


Anthony Elliott é professor de sociologia das universidades South Australia e Keio, no Japão. Em 31/12, publicou artigo na Folha discutindo um novo tipo de individualismo.

Segundo ele, o individualismo atual “nos encoraja a mudar tão completa e tão rapidamente que nossas identidades se tornam descartáveis”.
                                    
Ele cita o filósofo e escritor estadunidense Don DeLillo, para quem:

...o capitalismo mundial gera transformações à velocidade da luz, não só em termos do movimento súbito de fábricas, migrações em massa de trabalhadores e transferências instantâneas de capital líquido, mas em “tudo, da arquitetura ao tempo de lazer, à maneira pela qual as pessoas comem, dormem e sonham”.

Ora, em 1848, o Manifesto Comunista já afirmava que a burguesia “não pode existir sem revolucionar incessantemente os instrumentos de produção, por conseguinte, as relações de produção, e com isso, todas as relações sociais”.

Em relação ao mundo “profissional”, Elliott afirma:

A morte da ideia de uma carreira (uma vida de trabalho) desenvolvida dentro de uma só organização foi interpretada por alguns como sinal de uma nova economia —flexível, móvel, operando em rede. O financista e filantropo internacional George Soros argumenta que transações tomaram o lugar dos relacionamentos na economia moderna.

As transações que tomam o lugar dos relacionamentos identificadas por Soros continuam a movimentar mercadorias, ainda que, atualmente, muitas delas nem existam e circulem por meio de pulsos eletrônicos.

O conceito de “fetichismo da mercadoria” apresentado em “O Capital” diz algo muito parecido. É a relação entre as mercadorias ocupando o lugar da relação entre as pessoas.

Soros, DeLillo e Elliott poderiam dar os devidos créditos a Marx e Engels. 

Até agora, Trump vem perdendo para Churchill


Dias atrás, Trump chamou de “países de merda” o Haiti e nações africanas.

No mesmo período, estreou o filme “O Destino de uma Nação”, que retrata Winston Churchill como herói da liberdade.

O que uma coisa tem a ver com a outra? Vejamos.

Em 11/01, Richard Seymour escreveu na revista “Jacobin” sobre o famoso primeiro-ministro britânico. Segundo o artigo, no final da Segunda Guerra, Churchill afirmou: “Devemos varrê-los, cada um deles, homens, mulheres e crianças. Não deve restar um japonês na face da terra”.

Mas tem mais.

...não admito que um grande mal tenha sido feito aos índios vermelhos da América ou aos negros da Austrália (...) pelo fato de que uma raça mais forte, uma raça superior, (...) invadiu e tomou seu lugar.

Visitando a Itália em 1927, declarou a Mussolini: "Se eu fosse italiano, com certeza estaria a seu lado desde o início para concluir sua luta triunfante contra os apetites e paixões bestiais do leninismo".

Escrevendo sobre suas "relações íntimas e agradáveis” com Mussolini, acrescentou que "no conflito entre fascismo e bolchevismo, não há dúvidas sobre de que lado ficam minha simpatia e convicções".

Mas Churchill não se limitava a proferir barbaridades. Ele autorizou o uso de gás venenoso contra rebeldes que combatiam o domínio britânico no Iraque. Na verdade, já havia ordenado que se fizesse o mesmo contra a Rússia dos bolcheviques.

Um caso de pioneirismo foi a utilização do terrível “agente laranja” contra rebeldes na Malásia. Muito antes que as tropas estadunidenses fizessem o mesmo no Vietnã.

Por enquanto, Trump vem perdendo para Churchill na condição de criminoso racista. Por enquanto...